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Candeia - partideiro de primeira



A História oficial sobre o brasileiro Antônio Candeia Filho retrata-o como um homem simples com algumas realizações. As narrativas são, no geral, sobre sua vida cotidiana. Das brigas e do jeitão truculento que o colocou numa cadeira de rodas, à criação do GRAN Quilombo num período efervescente do carnaval carioca. Da Filosofia do Samba ao Axé!. Da vida à morte em muitos sentidos. Entretanto, a trajetória de Mestre Candeia é uma mitologia esquecida, quase apagada. Ele foi, talvez, o maior ícone da cultura popular brasileira na década de 70 e figura até hoje ent

re os maiores heróis de nossa história cultural. Negro, pobre, favelado e depois deficiente. Tudo o que não passa na novela das oito o faz representar, ao mesmo tempo, diversas categorias de um mesmo povo excluído e marginalizado. Porém, tal qual aqueles que lutam pela consolidação dos direitos mais básicos que possam existir para o exercício da cidadania, Candeia não foi um homem à frente de seu tempo, ele foi um homem que lutou contra o seu tempo. Por isso mesmo há uma história velada sobre o herói. A afirmação de direitos básicos e fundamentais, bem como dos direitos humanos é resultado de um processo constante de luta popular. Depende de um compromisso ético fundamental e intransigente em relação à causa. O seu avanço é diretamente proporcional ao surgimento de diferentes movimentos sociais e, também, de líderes que se doam para a efetivação desses direitos. Dentro disso, destaca-se a importância do reconhecimento das diversidades como forma de criar-se uma consciência coletiva de tolerância e não violência. Assim, não há espaço para o preconceito e a discriminação, uma vez que reconhece-se o outro como um igual. O samba é um movimento popular (espontâneo) na sua gênese. É um instrumento em si mesmo. É a afirmação da Declaração Universal da Diversidade Cultural da ONU. É a própria diversidade que fala, canta, dança e se comunica. E Candeia com isso? A História que não se conta sobre Mestre Candeia é a de sua trajetória na militância pela efetivação dos direitos sociais no Brasil. É a do reconhecimento de um povo oprimido por um sistema desigual que luta para ser ouvido por meio da arte e que faz, da própria arte, sua arma pela expressão de seus problemas. Sambas como os que Candeia gravou são sinônimos de crítica social sobre um sistema falido mas que ainda hoje se faz presente distribuindo desigualdades país afora. Quando o Mestre grava Ouro Desça do Seu Trono de outro Mestre, Paulo da Portela, no disco Axé! de 1978, escancara a o seu descontentamento e desentendimento sobre os rumos do carnaval, cada vez mais “midiático” e do “capitalista” e cada vez menos popular, do povo, mesmo. O interessante é que a sua leitura não é individual, ele é o representante “estridente da revolução democrática da cultura”, tal qual descreve Florestan Fernandes.


Aliás, outras gravações do Mestre (e quase todas, pra falar a verdade) trazem a leitura de um povo sofrido e oprimido em meio a um contexto de luta por emancipação, é o caso, por exemplo de O Invocado, gravada também em 1978. Ora, “o crioulo no morro está invocado, o crioulo no morro está no miserê, desce o morro, não encontra trabalho, nem encontra feijão pra comer... Se subires lá no morro e ver o crioulo invocado, podes crer que o irmãozinho se acha desempregado”. Portanto, a mitologia (poética) de Mestre Candeia revela a trajetória da militância dos direitos humanos no Brasil e traz consigo elementos de uma memória que parece sofrer um processo de enfraquecimento via o não reconhecimento dessa luta, por meio de um samba que não se faz mais e através de uma história contada pelos que venceram, até então, a contenda que continua a ser travada.


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